sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Agnés, não!

TERCEIRA PARTE

Ele voltou ao petit appartement, percebeu que estava sozinho. Rapidamente com uma passada de olhos e ouvidos atentos não detectou nenhum barulho que denunciasse a presença dela. Trazia consigo um embrulho branco, de dentro fez surgir um tubo com a tampa em formato de spray.

Logo foi ter no canto da porta onde ainda estavam as malditas formigas subindo e descendo, esbarrando-se, encontrando-se e a cada encontro pareciam se comunicar por um segundo. Possuía um olhar não muito amigável em cima daquelas pobres coitadas, estava pronto para dá um fim naquela festa.

Cobriu o nariz e a boca com uma camisa velha esquecida em uma cadeira e começou o massacre das formigas. Assim que espirrou o líquido a primeira vez as pequeninas congelaram entre a madeira da porta e a parede, mesmo aquelas que tentaram fugir não se salvaram da força do veneno e do assassino. Algumas logo foram caindo no chão, já cadáveres, outras ainda ficaram lá grudadas enfeitando o branco da parede.

Finalizou o trabalho, as visitantes indesejadas haviam morrido finalmente. Retirou a camisa que cobria o rosto revelando novamente a sua seriedade, e sentou-se para descansar, só então percebeu que o veneno vazava do tubo e pingava aos poucos em sua calça. Correu até a pia, apressado procurava algo que pudesse ajudar, colocou a mão na primeira coisa que viu, usou uma jarra de suco e despejou todo o líquido.

Sacudiu fora no lixo o tubo vazio e inútil, fez qualquer barulho com a boca revelando seu estresse e foi ter no banheiro.

A chegada dela não foi percebida por ele, entrou silenciosa, a mesma tristeza nos olhos e a garganta arranhando seca. Largou a bolsa na cadeira, pegou um copo e abriu a porta da geladeira. Se decepcionou, não havia água gelada, como também não havia muito que escolher para beliscar, a geladeira estava um deserto só.

Fechou a porta da gorda e vazia geladeira, então percebeu em cima da pia uma jarra de suco com o que lhe parecia ser água dentro. Seria o suficiente para fazer desaparecer sua sede.

Ele deixou o banheiro quando seus olhos a poucos metros da pia se depararam com a cena. Ela levava uma das mãos até a asa da jarra e em um movimento rápido pela sede que a dominava, serviu o líquido incolor em seu copo e em seguida subiu o braço até o mesmo copo quase alcançar a sua boca.

Agnés, não! Ele gritou.

Ela voltou-se para ele deixando escorregar da mão o copo de vidro que se partiu em pedaços no chão molhando seus sapatos pretos. Ele respirava assustado, em sua cabeça rodava um filme e a cena era Agnés morta no chão do apartamento após deixar descer pela garganta o veneno para formigas.

Agnés, a moça da blusa estampada e de sapatos pretos, não possuía os olhos tão tristes de antes. Agora eles cresciam um pouco no rosto, surpresos e mais satisfeitos, afinal o silêncio do outro havia sido rompido e por que ele havia gritado era o que menos lhe importava. Sorriu logo conquistando o sorriso dele.

As formigas partiram e com elas o silêncio atormentador que morava há dias no apartamento.

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