domingo, 31 de maio de 2009

I Capítulo


A Observadora

Chegava sempre ao local de trabalho com aquela bolsa pendurada no ombro esquerdo, aquela bolsa cheia de objetos grandes, pequenos, todos pessoais. No braço junto ao corpo trazia a pasta de relatórios revisados na noite passada.
Naquela segunda-feira seus cabelos estavam livres do prendedor, estavam bonitos, brilhavam de modo que suas colegas de trabalho não deixaram de notar com aquele olhar de inveja saudável ou não que todas as mulheres têm.
Em cima daquele salto banana desfilava em elegância até sua mesa no fim do corredor. Sempre que abria aquela porta de vidro e entrava em seu mini-escritório sentia-se em uma cabine, não uma cabine telefônica onde você entra e disca os números que quiserem e fala com quem quiser.
Ali estava uma cabine de responsabilidades, uma prisão remunerada, onde devia atender os telefonemas daqueles que eram simpáticos e também daqueles insuportáveis. Acreditem esses últimos sempre ligavam.
Tirou a bolsa de seu ombro e a pendurou no ombro de sua cadeira onde agora se sentava. Aqueles relatórios logo seriam despachados para a colega ao lado e depois para o outro.
Seu pé direito dançava impaciente, enquanto as mãos trabalhavam na mesa organizada e os olhos, esses não tiravam a atenção da prisão de vidro em frente a sua.
Então aquele homem de sapatos escuros, calça e camisa social, e com aqueles fios de cabelos castanhos que ainda molhados eram negros, alinhados, para compor a aparência de homem sério, responsável. Abriu a porta e logo estava dentro.
Nada fora da cabine era digna de sua atenção, estava atencioso apenas a aquele espaço de vidro.
Na mesa havia alguns papéis fora de ordem, sim parecia não preocupar-se tanto com a organização. Juntou todos aqueles papéis em uma pasta e livrou-se dela a jogando na gaveta.
A mesa parecia mais organizada agora. Um porta-retrato da família, mãe, pai, irmã. Um computador que mais parecia uma caixa cheia de informações virtuais, eletrônica.
Tudo aquilo era assistido pelos discretos olhos da cabine da frente. Ela percebia cada movimento do outro sério na cabine da frente.
A mão sem aliança que atendia ao telefone, os lábios que falava sem voz com alguém do outro lado da linha.
Naquela manhã o assunto no telefone devia estar muito irritante. Os traços do seu rosto mostravam a impaciência dele, o franzido da testa denunciava o questionamento ou talvez a discordância de algo.
Os óculos descansavam na mesa, enquanto tocava o cabelo alisando com as mãos do inicio da testa até a nuca com aqueles cotovelos apoiados na mesa. Logo tirava o estresse do rosto com as mãos.
Em momento de distração colocou grande os olhos além do vidro, a colega trabalhava em movimentos contínuos com os dedos no teclado do computador. Assim como o outro do lado, o outro, até o fim do corredor.
A observadora havia disfarçado quando percebeu que as mãos do colega estavam prestes a descobrir os olhos e avistá-la o espiando.
Os ponteiros do relógio indicavam que era meio-dia em ponto, exatamente aquele horário tão esperado pela maioria dos funcionários. Meio-dia, os dois ponteiros estavam ali unidos no relógio.
As portas das cabines abriam e fechavam uma seguida da outra, algumas ao mesmo tempo.
Tirou da cadeira o peso da bolsa e colocou em seu ombro um pouco exausto, pensava que precisava de uma massagem. Desligou o computador, estava deixando a cabine de responsabilidades.
Deu-se conta de que o homem de cabelos alinhados da cabine da frente ainda estava lá oferecendo sua atenção completa a caixa de informações virtuais, fazendo observações com a caneta em um papel em branco.
Fechou a porta, distraída com os olhos no colega não sentiu que ao fechar a cabine faria barulho, e esse foi inevitável.
Os olhos atentos deixaram o computador e fixou-se na colega, de maçãs rosadas, a vergonha pelo ruído que fez involuntariamente não podia ser disfarçado.
Um sorriso que dizia um: Olá! Ela correspondeu aquele sorriso de lábios contidos e deixou o escritório.
Dia seguinte, estava frio, as nuvens cinza deixara o dia mais escuro sem o colorido do dia anterior.
A observadora estava lá novamente em seu posto, olhava, lia, relia relatórios, protegida do frio debaixo daquele taiê preto.
Não deixou de perceber que o colega estava belo. Trajado de seriedade, com aquele casaco preto por cima. Os cabelos pareciam já secos, podiam-se ver os fios agora castanhos.
Seu programa favorito foi interrompido pelo telefone que tocava desesperado. Logo desligou, era algo para logo se resolver.

II Capítulo




A Observadora não sabia que era também observada.
Notara seus cabelos escuros presos naquela manhã, escondia o brilho dos fios negros, mas não lhe tirava a beleza que trazia na face de finos traços. Era capaz de fechar os olhos e ver os dela puxadinhos no canto, seus lábios naturalmente vermelhos e aquela pele levemente rosada pelo blush.
A observadora havia desligado o telefone, mesmo assim o colega da cabine da frente ainda prestava atenção em seus movimentos. Ela esticou as pernas, deixou a cadeira de trabalho e aproximou-se de umas gavetas de arquivos, tirou a pasta azul.
Abriu, passava folha dava atenção a uma outras não, ajeitava delicadamente com uma das mãos os fios de cabelos que caiam nos olhos os colocando detrás da orelha.
Parecia satisfeita, abandonou a pasta na mesa e deixou a sala, logo ele se colocou a procurar algo para fazer, ela decerto colocaria seus olhos na cabine onde estava e o pegaria observando. Desapareceu no corredor.
Como se sentisse os passos aproximarem-se colocou os olhos grandes além daquele vidro, saboreava um cafezinho quente naquela manhã fria.
Novamente sentada atrás daquela mesa pegou na pasta azul, pela sua expressão sem mal ou bom humor havia um trabalho um pouco chato a fazer.
Quando o homem sério atrás daqueles óculos de grau tirava os olhos dela, a outra o observava. Ele destacando decerto os longos e brilhosos cabelos da colega e ela guardando em sua memória a concentração daqueles óculos na cabine da frente.
“Finalmente aquele expediente havia acabado, esperei o dia inteiro por isto”...
Como todos os dias abriam e fechavam as portas, ouvia-se o, até logo, de sempre e correspondiam-se os sorrisos de despedida.
Nem acredito que esse dia acabou meus pés doem dentro desse sapato 38, e minhas pernas, essas pedem que eu circule.
Eles estão saindo, as portas abrem e fecham ao mesmo tempo e depois de um expediente inteiro observando um ao outro trocam apenas uma palavra: Tchau! Ora isso chega a me causar revolta.
E lá se foram mais uma vez o homem sério para o lado direito da Rua Olavo Bilac, onde está localizado esse escritório. A outra seguia para o lado esquerdo, sempre pegava um taxi na esquina.
Fiquei por último, nunca vi esse escritório tão vazio. Não posso ver as cabeças concentradas nas cabines ao lado e nem na frente. Ninguém nos telefones, computadores desligados.
Não posso ir para casa sabendo o que irá acontecer amanhã, novamente meus colegas irão passar por desencontros de olhares, ficaram disfarçando seus interesses. Não, não vai dá para ver as mesmas coisas acontecerem amanhã.
Ainda tenho dez minutos antes que fechem o escritório, é o tempo suficiente para meu plano. Um bilhete!
Um não, dois bilhetes, um para cada e assinado por ambos. Mas o que aquele homem sério escreveria para ela? Mas claro, combino um encontro o mesmo bilhete para os dois com assinaturas diferentes.
“Adoraria dividir com você a mesa daquele café do outro lado da rua no horário de almoço”...
Isso precisa dá certo, pronto, bilhetes prontos, e dobrados, tenho dois minutos antes de fecharem o escritório para deixar os bilhetes na mesa de cada um.
Quando ele chega nessa cabine de vidro sempre olha para a foto da família, o que tem nos olhos de grau é saudade dos entes queridos, soube que todos estão morando em outro estado.
Deixo o bilhete aqui bem embaixo dessa foto.
Agora o recado para a moça da cabine da frente e minha missão acaba. Bilhete entregue a mesa e me despeço do trabalho por hoje.

III Capítulo

Vi aqueles quatro passos chegando ao mesmo tempo no escritório, pensei “se fosse planejado não seria tão perfeito”. Li nos lábios de ambos seguidos em sorrisos contidos um “bom dia”.
Não pisquei as pálpebras, a ansiedade pelo resultado daquele meu plano era muita. Os óculos de grau encontraram o papel bilhete em baixo do porta-retrato, sentir a necessidade de saber se a outra havia encontrado o dela, foi certamente a primeira coisa que ela viu.
Finalmente vi aqueles olhares se encontrarem e atravessarem um sorriso contente ,era uma mensagem de boa resposta. Havia dado certo.
Os ponteiros do relógio pareciam estar contra meu plano de unir aqueles dois. Ambos olhavam de vez em quando ou o relógio de pulso ou o relógio de mesa.
***

E saíram juntos do escritório, as mãos estavam livres queriam unir-se uma a outra, mas pensaram que era cedo. O café era logo ali do outro lado da Rua Olavo Bilac.
Tinha cavalheirismo, puxou a cadeira para que ela sentasse, e a outra não escondia o sorriso satisfeito daquela ação. Pediram algo ao garçom que logo serviu, a conversa começaria.
O que dizer afinal? Certamente pensaram, mas não havia o que dizer ora, passavam todo o dia olhando um para o outro em “segredo”, sendo discretos para que o outro não percebesse.
Devia apreciar o almoço, a companhia um do outro. Então o homem sem os óculos de grau falou sua primeira palavra.
... Fiquei surpreso ao receber o seu bilhete não pensei que...
Surpresa estava a observadora, afinal ela sabia que não havia mandado bilhete algum para o colega. Sorriu, e negando balançando a cabeça disse-lhe:
...Mas eu não mandei nenhum bilhete, você quem me mandou...
...Como assim eu recebi...
Os papéis tirados de seus bolsos eram os mesmos que eu havia assinado como se fosse eles e deixado em suas cabines.
Trocaram os bilhetes precisavam conferir suas letras e assinaturas, então o meu plano foi descoberto. A caligrafia era igual as assinaturas diferentes, a palavras iguais.
...Fizeram os bilhetes e colocaram em nossas mesas, me desculpe não sei onde coloco minha cara...
...Fomos vitimas...
Sorriram, os olhos dela não conseguiam alcançar os dele por vergonha, o homem já não era mais sério, aquele ar de responsabilidade todo o tempo havia sido deixado na cabine antes de sair do escritório.
...Quem pode ter feito?
...Não sei, mas sabe que parece que quem escreveu sabia o que estava fazendo!
...Do que estar falando?
...Não saberia te convidar para sair e alguém leu meus pensamentos e o fez!
Então estava feito. As palavras do colega fizeram nascer um sorriso de esperança na observadora, nem pensou mais em quem poderia ter mandado os bilhetes.
As mãos do colega alcançaram as delas do outro lado da mesa, as unhas, os dedos finos, podia sentir finalmente que a observadora era mesmo mais do que aquela imagem que sempre, todas as manhãs percebia além daquele vidro.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Apenas uma menina...


... O que falar e como falar sobre nós mesmos? Não parece uma missão nada fácil.
Pois bem começo aqui nessas linhas a difícil missão de falar de mim mesma. Por que interessaria a você saber sobre mim? Não sei, mas sinto a necessidade nesse momento de escrever nessas linhas um pouco sobre mim que sou apenas uma menina crescendo a cada nascer do sol.
Quero mostrar o meu lado A e desde já deixo dito que não esconderei o meu lado B, esse que muitos insistem em esconder, esses que muitas das vezes mostra quem realmente são.
Sinto como se a todo tempo olhos curiosos me perseguissem, procurando coisas em mim, penetrando fundo em minha mente procurando meus segredos, procurando meus defeitos e cochichando sobre eles. Falo da timidez que insiste em não me abandonar.
Idas e vindas todos os dias pelos mesmos lugares, pego sempre a mesma jaula ambulante para ir e voltar da faculdade, e sempre a mesma e velha companhia a minha timidez nem amiga nem inimiga, de mãos dadas comigo.
Coisas do coração? Ela sempre colocara obstáculos nas coisas do coração, mas não significa que nunca fui feliz nessa questão, afinal uma “mulher sem amor é como rosa sem sol”...
Na verdade queria ser como as personagens que crio quando escrevo. Elas sim têm a atitude que me falta para realizar o que tem vontade sem medo de saber o que a vida vai lhe dá como resposta.
Balanço de um lado a outro dentro do ônibus, mas o que parecem se misturar é meus pensamentos na minha cabeça pensante, como frutas batidas no liquidificador, depois sempre antes de dormi ou nas madrugadas em que perco o sono, anoto tudo nas linhas do meu amigo.
Tudo bem, esse meu lado tímido e também silencioso às vezes não quer dizer que sou uma bonequinha de porcelana guardada na prateleira da menina romântica. Não.
Também tenho em mim o que posso chamar de animais perigosos. Sou fera quando desorganizam minhas coisas, sou bicho do mato em dias de tédio, e sou uma gata quando quero, ou seja, na maioria das vezes.
É bem, como disse que falaria do meu lado B, devo dizer que sou indecisa, às vezes, sempre, não sei dizer. Mas eu e minhas indecisões acabamos confundindo até a mim mesma, se quero azul ou verde, chuva ou sol...
Vai saber o que se passa na minha cabeça, fabrica de idéias um pouco loucas, mas também com juízo. Sim juízo, isso a vida me deu.
Sonhadora que só eu, não imagino castelos e príncipes encantados, imagino um lindo campo, um céu pintado de azul, o sol dourado, corações batendo, um abraço bem apertado.

Desconfiada. Aí ta uma coisa que não consigo negar que o sou.
Não preciso falar muito sobre isso, todos entendem, afinal quem gosta de ser enganado? Acredito que ninguém.
“E não fale assim comigo, sou sensível mesmo”... Sensível as palavras, quando ditas de maneira errada, na hora errada e em tom alto demais para serem carinhosas.

Podem ser que digam que é apenas TPM, ou que ando mesmo muito chata. O fato é que o mundo é que anda muito chato, sem muitas novidades que me interessem e sem dias muito bonitos...
Aquela fase de uma felicidade sem motivos que veio me acariciar o rosto há algumas semanas atrás passou. O que tenho agora são tardes de tédio, de coisas monótonas.
As pessoas só falam nas mesmas coisas, as roupas que visto são as mesmas, as ruas são as mesmas, os caminhos são exatamente os mesmos...
Enquanto desejo silêncio todos falam ao mesmo tempo. E é exatamente aqui onde quero chegar, silêncio. Nos últimos dias tenho apenas desejado isso, silêncio, um lugar sem vozes agoniadas em dizer tudo ao mesmo tempo com receio de esquecer-se de falar qualquer palavra...
Minha vontade é de fugir de tudo e todos, essa é a verdade, fugir de tudo, de casa, da faculdade, das mesmas ruas que passo todos os dias, fugir desse mundo...
Mas sei muito bem que fugir do mundo não dá queridos, então que eu pudesse ir para o lugar mais tranqüilo dessa cidade, perto do verde, no meio da semana, com um colo para poder deitar minha cabeça e receber um carinho nos cabelos. E que esse amigo pudesse respeitar o meu silêncio também em silêncio...
Só isso que desejo nesses últimos dias que não sei o que há comigo.
Agora sim entendo bem uma frase que em algum lugar, em um dia qualquer li que dizia mais ou menos assim, “Quero fugir, mas preciso de alguém de confiança”. Queria sentar e ver o sol adormecer em silêncio, só queria paz.
Quero também poder apenas ficar só, sem que me perguntem o porquê, não quero responder perguntas quero apenas ficar só às vezes. Isso basta.
Que o sol nasça e morra rápido e os dias passem e assim o vento leva esse meu sei lá o quer, de tédio.