Como disse um dia a Clarice Lispector: "Suponho que me entender não é uma questão de inteligência, e sim de sentir"...
segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011
Uma mania infernal
Era atormentada por algo mais forte que ela, algo que não tinha nome, nem forma, mas que habitava dentro dela e consumia os seus pensamentos, vivia do consumo de seus pensamentos. A confundia, a fazia brigar, vivia em conflito com essa coisa invisível e seu Eu, seu corpo era uma casa sem paz nos dias em que aquela bendita vinha para lhe acariciar.
A luz do dia iluminava tudo, penetrava pelas janelas e portas abertas iluminando móveis, porta-retratos, chaves penduradas na parede. Na cozinha preparava um suco para saciar a sede, com as mãos apressadas colocava as frutinhas vermelhas em poções dentro do liquidificador, depois água fria, então apertou o botão e o bicho começou a triturar tudo, aquele monstro.
Ela podia saber quando as frutas perdiam suas formas pelo barulho, que de grosso se tornava mais suave. Diante dos seus olhos a cor das frutinhas vermelhas ia perdendo o vivo do tom e ficando mais claro, e surgia a espuma branca cobrindo o sabor que guardava aquele suco de acerola ainda amargo, pois que não havia açúcar. Estava pronto, precisava coar.
Desligou o liquidificador, agora ele estava em silêncio, colocou as duas mãos no copo, antes mesmo de desencaixar do aparelho foi tomada pela força sem rosto que lhe fez colocar uma das mãos novamente no botão. Voltou a ouvir o barulhento, e então desligou, mas aquilo dentro dela era mais forte, lhe roubava a paz dentro de sua cabeça e voltou a ligar e desligar. Finalmente desencaixou o copo do liquidificador e colocou o suco no coador.
Era uma ansiedade que lhe invadia, uma mistura de pensamentos por cima de pensamentos que apareciam de repente em sua cabeça como um mar em ressaca, onde ela tentava nadar e chegar à praia e ficar a salva de tudo aquilo, mas não conseguia. A força era maior e lhe fazia continuar com aquelas manias de repetir gestos e coisas.
Acreditava que se não o fizesse lhe aconteceria o mal, o contrário do que almejava, e a sua insegurança acompanhava a ansiedade nesse barco e se aproveitava da situação fácil e frágil da personagem para também participar da tortura.
Quando estava com a mente desocupada essa dupla unida se aproximava e lhe dava noticias. Assim continuou durante toda a tarde e permaneceu quando a noite chegou. Antes de dormir passou por todo o ritual até cair na cama e fechar os olhos. Primeiro escovava os dentes até reconhecer que estavam brancos, depois bebia água e caminhava até o quarto, mas não antes de ter certeza de que a porta da frente estava mesmo trancada.
No quarto, olhou em volta como uma câmera que capta tudo muito rápido, e não havia insetos para lhe roubar o sono mais tarde. Apertou o interruptor e se encontrava no escuro quando a força veio e lhe fez voltar a ligar, estava escuro, depois claro, depois escuro, e novamente claro, e depois outra vez no escuro, e quando tentou ligar mais uma vez só pôde ouvir o barulho do interruptor. A luz havia queimado, então foi dormir.
O que fazia, quando entenderia que não eram as coisas que conseguia tocar, e que se sentia obrigada a fazer que lhe faria mal? E sim as energias que depositava ao acreditar naquela neurose que lhe invadia a cabeça.
Estava louca ou era normal até demais? Não se sabe.
quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011
Eupersonagem do Eric Rohmer
Ainda não assistir muitos dos filmes do Rohmer, apenas dois, porém esses dois me fizeram sentir a estranha sensação de crê que sou uma personagem do cineasta nouvelle vagueano. Eu sei, pode parecer estranho, mas não é. Afinal estamos falando de cinema cotidiano, estamos falando de Eric Rohmer.
Essa semana assisti “Pauline a la plage” (1983). Pauline uma adolescente e sua prima já adulta vão juntas passar uns dias na praia, enquanto ela se envolve com um rapaz de sua idade, sua prima que se julga experiente nos assuntos do amor está envolvida com um rapaz que a engana. Eric Rohmer coloca duas mulheres em idades diferentes vivendo seus amores e dessa maneira nos deixa claro que independente de idade o ser possui um pouco de imaturidade no que diz respeito ao amor.
Me sinto completamente Delphine em “Le rayon vert” (1986) , o primeiro que assistir do cineasta quando comecei a entrar em contato com as obras do movimento francês Nouvelle Vague, é também um dos meus filmes favoritos.
Delphine é uma secretária que mora em Paris. Duas semanas antes de tirar férias sua colega de viagem desiste de ir para Grécia, sem saber o que fazer das férias ela aceita alguns convites de amigos para viajar, mas sempre acaba voltando a Paris sentindo-se incompreendida, solitária. A última tentativa da personagem é a praia, lá ouve uma história sobre a lenda do raio verde, que é visto no último segundo do pôr-do-sol no mar. Segundo a lenda do livro do escritor Júlio Verne quem ver o raio verde tem seus pensamentos mais íntimos e os das pessoas a sua volta revelados. Decidida a voltar novamente a Paris, Delphine conhece um rapaz na estação de trem e resolve tentar aproveitar o que lhe resta das férias, mas antes deseja ver o raio verde.
As conversas entre os personagens nesse filme, na mesa enquanto fazem a refeição em uma das viagens, por exemplo, não há nada mais cotidiano que cenas como essa, tão simples e próximo de nós, do real.
O cineasta abusa dos diálogos, deixando as ações em segundo plano, prefere a discussão sobre as suas dúvidas, problemas, a vida. É um cinema de paciência, de contemplação, que vai fundo na alma, no ser.
quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011
...
"Estou quieta como uma xícara
Espero que vc venha e me provoque
Depressa! Venha me acordar..."
(Beleza Roubada)
quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011
Notre film/ Nosso Filme
Eu atuo,
tu atuas,
nós atuamos
Eu dirijo,
Tu diriges,
Nós dirigimos.
Um filme em plano sequência,
Nada de cortes, beijo atrás de beijo,
Abraços atrás de abraços,
Closes nos seus, nos meus olhos.
Você toca a trilha sonora
Em seu violão de uma só corda
Eu decido o figurino,
o que vestimos ou não vestimos...
Cenários de lua cheia
Ou na praia ao entardecer
Esperar o raio verde aparecer.
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